terça-feira, 19 de maio de 2009

Uma estranheza improvável

Seria improvável! Primeiro o preâmbulo, para que possam entender toda a história: um rapaz boa pinta, com uma segurança invejável e um amor próprio admirável. Dia-a-dia nas baladas, na rua, na companhia de amigos, rodeado de compromissos, trabalho sobrecarregado e com uma agenda atribuladíssima. Mora sozinho, cuida de sua vida [junto com muitas outras pessoas, porque cada um cuidar só da sua própria vida apenas é, na certa, monótono...]. Enfim, um amor de companheiro, de amigo, de ser humano, de confinça e de bom senso. Ele chega em qualquer lugar e consegue fazer amigos; até mesmo 'de infância'. Sabe conversar, tem assunto para tudo e sabe o que pedir, e como pedir, e o que fazer. Tem o domínio das palavras, e sabe a hora certa de agir.

O mais engraçado, nesse ponto [talvez não agora, mas garanto que vai ficar], é que ele sempre conseguia o que queria. Aliás, ele ainda acredita que pode conseguir o que quer! E sabe mesmo que pode! Tudo, t-u-d-o que sempre quis, foi atrás, lutou e consquistou. Emprego bom, farras boas, companhias agradáveis, viagens inesquecíveis, conquistas, paqueras, confiança... Ele era rodeado das melhores coisas que a vida oferece. Dessa forma, firma-se o ditado: 'Esse menino nasceu com o * virado para a Lua' [ou melhor dizendo, 'esse garoto é tão sortudo que nasceu com a Lua dentro do *', para ser mais exato]. E assim ele vive até hoje, aos vinte e poucos anos.

Em uma noite qualquer, daquelas bem clichês mesmo, de céu claro, abarrotado de estrelas, temperatura agradável... ele decidiu sair de casa. Cinco ou seis amigos, talvez sete, fora os outros tantos que ele encontrou na boate... Maldita noite! Ou maldita 'falta de... de... de sei lá o quê'. Um "ex-rolinho", agora amigo, veio cumprimentá-lo. Entre sorrisos e cordialidades, a companhia se fez ainda mais agradável: 'esse daqui é o fulano. Fulano, esse aqui é o siclano'. O fulano nunca mais saiu da cabeça dele.

Será que foi o sorriso? O toque da mão? Ou os dentes bem cuidados? O bom gosto para se vestir? Poderia ser a carência [mas não, não mesmo - ele não estava carente!]?A noite resumira-se entre a incerteza de uma sensação absurda e a admiração platônica. Os olhos não se desviavam. Guiado por um êxtase inexplicável, ele deixou a noite passar como se ela tivesse, enfim, finalizado naquele mesmo instante. Que insano! E o pior não é isso. Essas coisas acontecem com qualquer um... ou ele achava que sim. A ordem natural das coisas faria com que ele fosse lá, despejasse os seus mais galanteadores encantos e cantadas, seu charme natural, e a noite poderia, finalmente, começar.

Nada disso aconteceu. Ao contrário, ele passou umas duas [ou três, ou mais] semanas segurando-se para não procurá-lo no orkut. Evitava falar sobre. Não queria saber mais nada do que já sabia, bastava o muito que tinha descobrido naquela noite [in]feliz: o simples fato dele ser 'o número exato' para ele. O que mais ele sabia? Nada! N-a-d-a mesmo! Não falava com ninguém sobre seu surto platônico, evitou ao máximo que pode tocar no assunto e nem sequer mencionava-o aos amigos. Era insano... isso ele sempre soube. Até que, por acaso [e pasmem: acaso mesmo], ele viu o orkut dele na página de um outro amigo.

A partir daí, tornou-se natural olhar as 82 páginas de comunidades que ele tinha, uma por uma, minuciosamente. Descobrir as afinidades, encantar-se com as semelhanças, perceber as mínimas diferenças, sorrir com as escolhas feitas... Estava tudo perdido. O encanto tinha se consolidado. Duas abas abertas todos os dias, o tempo todo: uma constava a sua página principal, na outra, o perfil do fulano [detalhe: fotos bloqueadas, recados bloqueados... tudo bloqueado], mas, mesmo assim, compensavam as horinhas dedicadas ao devaneio com a foto, e o fato de, inevitavelmente, decorar até a ordem das maravilhosas e bem escolhidas 820 comunidades [e se aumentava ou diminuía uma, ele sabia imediatamente].

O fato consumado, dito e feito, não passa disso, até agora. O máximo que tinha conseguido fazer, em uma outra noite de encontro casual, no auge de sua [in]segurança [afinal ele tinha caprichado excessivamente para sair aquele dia - que o diga o seu cartão de crédito], ele despejara desordenada e quase ilegivelmente um 'depois quero conversar com você a sós', após ter atravessado a boate inteira só para despedir-se dele. Como que uma pessoa tem coragem de soltar uma frase tão mal elaborada a uma pessoa com a qual só se cumprimentava? É muita falta de jogo de cintura, de feeling para a ocasião.

Dito pelo não dito, o fato é que isso tudo não é psicopatia, não é paranóia e não é de se ter medo. É uma coisa inexplicável, que mesmo exteriorizada, não vai justificar o ato de ser. Bonito? Esquisito? Complexo? Surreal? Exemplar? Sabe-se lá. A questão é: se ele não consegue nem adicioná-lo no orkut, que é uma ferramenta feita para fazer com que a aproximação seja facilitada, o que virará essa história? Nesse momento, o que se passa na cabeça dele é que essa vai ser uma excelente estória para se contar, com boas risadas e com uma dorzinha fina e aguda no coração! Sim, é questão de c-o-r-a-ç-ã-o. Uma estranhesa bonita de ser e de existir.

Uma coisa improvável. Uma coisa que tinha que ser improvável! [Paco]

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